sexta-feira, 4 de março de 2011

"Chapéus há muitos..."

"Chapéus há muitos...", uma afirmação por demais conhecida . Só que, desta vez, não se reporta aos heróis do cinema da década de 1940. Falo de um tempo bem recuado, século XVI, uma imagem de Portugal em 1578-1580: Ritrato e Riuerso del Regno di Portugallo. Documento que merece uma leitura atenta, uma apreciação do nosso País que não se afasta do tom crítico de outros textos da época. Por ora, fixei-me nos "chapéus", embora os mais curiosos possam saber mais acerca do vestuário daquele tempo. Basta pesquisar na Internet...

" Os trajes, como antes disse, são longos e pretos., de tecidos muito reles e usam-nos por mutio tempo. Andam sempre de chapéu, de botas e com meia espada se vão muito a cavalo. Não há diferença alguma entre o fato dos nobres e o dos não-nobres, dos pobres e dos ricos, nem dos amos e dos criados. Aliando-se a estes trajos os comportamentos e os rostos morenos e melancólicos, ao entrar uma um estrangeiro em Lisboa parece-lhe contemplar um horror inferna, porque as casas, as ruas, os homens, os trajos, a língua e os costumes todos clamam horrendamente. Têm diversos tipos de chapéus que usam consoante os lugares e as horas e não chega, como nas outras partes, pôr o chapéu quando chove e o barrete quando faz Sol. Para as suas circunspectas cabeças tornou-se necessário prover diversas espécies de cobertura, para que não se evaporem, todas feitas de modo diferente e com diversos nomes: chapéus, gorra, carapuça, barrete, gualteira simples, gualteira de rebuço, monteira e outras.

Quando se anda na rua deve-se levar chapéu, quando se está em casa a gualteira, e quando se vai à igreja ou visitar um amigo a carapuça, no campo usa-se a monteira, e assim se vai variando. Deve-se estar atento e não cometer erros, porque levar chapéu em visitas é falta, e a gualteira nas ruas seria notada como loucura, e assim com todos os outros fora do devido lugar. Aconteceu às vezes, em casamentos e em outras festas importantes, muito nobres portugueses terem de vestir-se à maneira de Itália. Fizeram-no de modo tão rico que não se podia exigir mais. Tinham sobre si toda a seda e todo o ouro que é possível usar, tendo mandado vir também da corte de Castela alfaiates e sapateiros. Com tudo isto, apresentavam-se tão sem garbo e tão mal amanhados que pareciam vilãos disfarçados."


Uma Descrição de Portugal em 1578-80, Tradução do Italiano e notas por A. H. Oliveira Marques, in Revista Nova História , nº 1, 1984

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