O grande país, que é Angola, moderniza-se. Porém, os caminhos do desenvolvimento económico e cultural desenrolam-se em atitudes e comportamentos contraditórios. Realidades dos novos quadros sociais que não escapam ao olhar atento de jornalistas e escritores. Pepetela e Eduardo Agualusa assumem, cada um à sua maneira, a crítica dessa sociedade. Lembro do primeiro o romance Predadores e de Agualusa, O Vendedor de Passados.
Este remete para a nova burguesia endinheirada de Angola. Sátira onde o bom humor casa com o tom crítico e, simultaneamente, poético desta construção de identidades falsas... Leve e divertido, este "Vendedor de Passados" não é uma obra superficial. Comenta e reflecte temas diversos, alguns bem comuns. Escolhi um deles que intitulei "palavras antigas".
"Gaspar, assim se chamava o professor, comovia-se com o desamparo de certos vocábulos. Dava com eles abandonados à sua sorte, nalgum lugar ermo da língua, e procurava resgatá-los. Usava-os com ostentação e persistência, o que consternava uns e desconcertava outros. Creio que triunfou. Os seus alunos começaram por utilizar esses vocábulos, primeiro por troça, a seguir como uma gíria íntima, uma tatuagem tribal, que os fazia distintos da restante juventude. Hoje, assegurou-me Félix, são ainda capazes de se reconhecerem uns aos outros, mesmo quando nunca se viram antes, às primeiras palavras.
" Ainda tremo de cada vez que ouço alguém dizer edredon, um galicismo hediondo, em vez de frouxel, que a mim me parece, e estou certo que você concordará, palavra muito bela e muito nobre. Mas já me conformei com sutiã. Estrofião tem outra diginidade histórica. Soa, todavia, um pouco estranho - não concorda?"
1 comentário:
Gosto dos dois e admiro sobretudo Pepetela, pela luta que travou pela independencia e pela luta de democratização de Angola - aho que desistiu ...
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