sábado, 14 de maio de 2011

Como a Guidinha retratava Portugal em 1973...


















Para quem esqueceu o significado de 1973, o ano do choque petrolífero e do agravamento das condições de vida. Tempos difíceis que precederam o 25 de Abril. Para muitos de nós ainda ainda permanece viva a memória das horas passadas nas filas para a gasolina, um bem escasso e cujo preço "subiu muito". O litro rondava mais ou menos 2,5 ou 3 escudos; um valor próximo dos actuais 15 cêntimos!!
A sátira fintava a censura e Luís Sttau Monteiro sabia como. Pelas redacções da Guidinha que o Diário de Lisboa publicava no suplemento, A Mosca, passava muito do quotidiano da época. Para sorrir e reflectir...

" Buff que estou mesmo a cair de cansaço logo de manhã a minha mãe mandou.me para a bicha do leite e quando cheguei a casa e disse que tinha lá estado mas que não tinha conseguido leite mandou-me para a bicha do bacalhau ia a dar-me uma estalada mas o meu primo Manel do Mercedes não deixou e disse que era verdade porque ele de manhã tinha estado na bicha da gasolina e também não tinha conseguido gasolina estávamos nesta conversa e o meu pai chegou a casa e todo baforido (...) disse que era preciso comprar arroz porque ia subir de preço e o meu primo disse logo que o óleo e o azeite também iam subir e a minha mãe vestiu o casaco para ir à rua comprar estas coisas e pediu dinheiro ao meu pai e ele rapou da carteira e deu-lhe vinte escudos para asa compras ora toda a gente sabe que que agora com vinte escudos não se compra nada de maneira que a minha mãe teve de despir o casaco outra vez a choramingar muito triste por não poder encher a despensa mas lá que ela é esperta isso é no meio da choraminguice meteu os vinte escudos no bolso como quem não quer a coisa e se o meu pai não a tivesse visto ainda a esta hora lá estavam mas ele é que não é parvo nenhum de maneira que daí a dez minutos foi à cozinha perguntar pelos vinte escudos e ela teve de lhes dizer adeus coitada cá em casa há uma contabilidade bestial ninguém vai em golpadas é o vais! Quem anda contente com a falta de gasolina é o meu pai esse anda a dizer que vão ser obrigados a não deixar as pessoas passear ao domingo e que o resultado disso vai ser as pessoas não poderem ir ao futebol e eles não terem outro remédio senão porem os jogos na televisão o que é bom para quem não tem carro nem pilim que é o caso dele (...) cá na Graça há uma que arma a dizer que tem todo o bacalhau que quer porque conhece um senhor que conhece um outro que é primo dum outro enfim uma bicha de conhecimentos que nunca mais acaba para compar um rabito de bacalhau! cá na Graça as pessoas armam a dizer que têm o que falta às outras é uma maneira bestialmente estúpida de armar mas as pessoas são assim mesmo e não há nada a fazer senão aguentar adeus vou para a bicha do sabão que anda para aí gente a dizer que vai subir."



Mosca, 27 de Outubro de 1973



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