quarta-feira, 14 de setembro de 2011

À cem anos eram neologismos...









Agora que o Acordo Ortográfico tanto dá que falar, repesquei alguns neologismos com cem anos. Tais palavras, que Ramalho Ortigão abominava, passaram a uso corrente. Passou tempo e agora ninguém mais dá por issso...





"A conversa seguia sempre com bom humor e eles nem davam por mim, que ia tomando apontamento do que diziam...Em certa altura o escritor disse a propósito do neologismo que a Imprensa começou, então, empregando...


- Secretariar!.. Secretariar!..Olhem que ratice destes mágicos do jornalismo!...


Disse uma frase engraçadissima que não fixei. Não pude conter uma gargalhada...


- Oh! oh! o nosso rapazinho achou graça! exclamou o senhor sorridente. E querem ver que ele conhece outro neologismo dos bons, dos autênticos...empregados pela jornalice da época?


- Conheço, sim, senhor Ramalho Ortigão...E um que vale bom dinheiro!...


- Abramos bem os nosso tímpanos, oh! Manuel de Macedo; a juventude catou coisa de tomo, pelo que oiço!!


- Os jornais e os presidentes de sessões inventaram uma palavra que me tem divertido imensamente, mas que não está bem espalhada...ainda não é clássica!...- Vamos lá a ouvi-la, jovem esperançoso!...


- Ho-me-na-ge-ar. Informei destacando muito bem as sílabas para fazer ressaltar a palavra...


- Homenagear?!...Ah! ah! exclamou o escritor com grandes risadas e batendo palmadas nas coxas! ah! ah! Ainda não ouvi, nem li essa nova chalaça!!... Não lembra ao diabo! Oh! Manuel de Macedo, o rapazinho caçou-a bem!...


- O pior é se a coisa pega! disse Macedo rindo muito...- Basta ser tolice para pegar ! acudiu Ramalho Ortigão continuando a rir.


-E ainda apanhei outra! disse eu muito contente com o aplauso do celebrado crítico...


- Oh! oh! tornou Ramalho Ortigão, o nosso rapaz vai bem na crítica! Vamos lá então ouvir essa outra laracha!...


- Não é tão aplicada nos jornais, mas lá irá com o tempo!...Lá irá também!...


- Bom! bom! O introito promete!...


- Pa-ra-nin-fa-ram os noivos os excelentíssimos senhores fulanos..........................................


- Olha o demonico que não a deixou escapar, oh! Macedo!...


Então é que foram risadas naquela casa abobadada do Museu das Janelas Verdes!...Calcule-se a alegria que se apossou o meu coração de aprendiz das letras...Estava radiante!...


Daí para o futuro tratou-me sempre com amizade e interesse. Quando nos encontrávamos vinha sempre com o inevitável:


- Paraninfaram os noivos, os excelentíssimos senhores...............................................................


E terminava com uma gargalhada prolongada, caústica, como só ele sabia despedir, e que tanto arreliava os insignificantes!...


- O facto é, caro amigo, que o vocábulo ficou!...Teve razão! disse-me um dia o grande crítico daí a anos; porque será que as palavras forçadas, pedantes e burlescas se fixam no toitiço de certa gente?..."



Júlio de Sousa e Costa, O rei Dom Carlos - Factos inéditos do seu tempo (1863-1908)




1 comentário:

goiaba disse...

Há muito tempo que aqui não venho sobretudo por cansaço na utilização desta máquina ... Voltei e andei por aqui.
Obrigada pelos vários post e pela curiosidade do último.
Abraço