segunda-feira, 26 de julho de 2010

Dia dos Avós


O Dia dos Avós, uma comemoração expressiva nestes tempos de esperança de vida em crescendo. Maior longevidade, mais avós ... mas nem por isso aumenta o número de netos. Falo do caso português, um país de baixa natalidade ( antepenúltimo entre os 27 da União Europeia).

Os avós representam o passado de uma sociedade, uma herança de "família" que importa salvaguardar e prosseguir. Herança feita de memórias e de "estórias" nem sempre vivenciadas. Metade dos meus primos não tinha ainda nascido quando os meus avós paternos faleceram e agora, que já passei a barreira da idade do seu "adeus", continuo a ter presente essa imagem de velhos, simpáticos, mas exigentes, e sempre amigos.

A relatividade do tempo agiganta tudo. Passava muito tempo em casa dos avós e lembro-me de coisas dos meus quatro, cinco anos. As vindimas apareciam como uma festa com a entrada no lagar para pisar uva, porque diziam ser um bom tónico para as crianças. E as brincadeiras na areia do rio, as caminhadas pelo campo na apanha da macela (camomila ), a subida às nespereiras para comer aquelas nêsperas tostadinhas do Sol...Mas também a má memória das tardes de trovoada quando o medo tomava conta de mim, porque grande era também o medo da minha avó. Sentava-me em cima de uma manta de lã e, andando pela casa, rezava em voz alta a oração a Santa Bárbara. E a trovoada obedecia à Santa protectora que nos poupou sempre aos perigos de algum corisco...
Do meu avô Francisco recordo o cavalo branco. Animal manso até um dia em que furioso, galopou tempo sem fim, tendo sido difícil apanhá-lo. E ainda a sua atrapalhação quando o "apanhei" a fumar às escondidas na adega...sabendo todos que isso estava terminantemente proibido pelo médico.

Do lado materno éramos muitos netos e eu, sendo do grupo dos mais novos, tive sempre um tratamento especial. Já os rapazes portavam-se muito mal e, às vezes, apanhavam um sopapo do avô.

Enfim, recordações indeléveis de um passado que, apesar de tudo, persiste. É assim como a Primavera, todos os anos, teima em renovar a Natureza. Dela tomei como símbolo a figueira: árvore que, embora velha, resiste a tudo e continua a dar fruto. Às vezes, é preciso podar os ramos velhos, adubá-la e regá-la para que a produção seja de bons e abundantes figos. Cuidar dos avós em sentido literal ou da sua memória é também uma obrigação de família, de filhos e de netos. Para salvaguarda de um passado, cujos frutos importa transmitir...

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Adeus, MIguel Torga




Inspiração poética para um "adeus" sem regresso.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

San Fermin já foi!

Tourada em Pamplona (foto in Sapo)

A loucura do Saint Fermin acabou ontem. Espécie de carnaval animado pelo gosto pelos touros que, durante nove dias, transformou Pamplona na cidade mais cosmopolita de toda a Espanha. Irmanados pelo vestuário branco e lenço vermelho ao pescoço, foram muitos os que quiseram partilhar a adrenalina destas festas. E seria interessante descobrir a nacionalidade desses turistas amantes da festa brava, incluindo aquele de barrete verde de campino. ( Seria português?! Nunca saberemos...)

Invocou-se o Santo padroeiro três vezes ao dia, largaram-se os touros pelas ruas, atropelaram-se os "corredores", eles e elas gritaram e gesticularam, correram e fugiram. Imagens impressivas que hão-de permanecer na memória de quem viveu e presenciou.

E tarde fora, continuaram os risos e muito vinho e depois veio a tourada. Disputa entre a bravura do touro e a valentia do homem que o enfrentava, procurando dominá-lo. Ecoaram "olés" e, mais uma vez, sentiu-se o medo, muito medo. Faenas bem conseguidas e outras a merecer assobios e, então, correu o sangue. Sangue muito vermelho que tingia touros e homens que, apesar disso ou por causa disso, continuavam...

Enfim, viveu-se um ritual e agora, passado que foi o Saint Fermin, resta esperar o próximo ano. Ah! desta vez, os acidentes não causaram mortes. Valeu a protecção do Santo!

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Alhos...à atenção dos produtores!


Alhos...desculpem o assunto, mas não posso calar o desabafo. Consumido desde a Antiguidade, o alho ganha cada vez mais adeptos. É benéfico para a saúde, ( faz bem a quase tudo), dá um sabor especial aos cozinhados, eis duas boas razões para o seu consumo.

Especialmente em tempos de contenção convém olhar à qualidade-preço e também aqui chegou a onda inflacionista. Já a qualidade deixa muito a desejar. O facto, que acabei de constatar agora mesmo, levou-me a analisar a embalagem e respectiva etiqueta que remetem para Alicante e Argentina. Importando alho da Argentina, via Espanha, não admira assim a falta de qualidade...

Não me espantei, porque me tinham falado já da "invasão" de alhos da China que uma cadeia de supermercados comercializa. Assim sendo, pergunto a mim mesma as razões por que não apostam os nossos produtores nesta cultura. Não haverá por aí algum jovem agricultor ( ou menos jovem ) interessado na produção de alhos? Consumidores não faltam, digo eu!....


Nota - Consulte a hiperligação no título e confirme as potencialidades do alho.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Quando o polvo vira oráculo...











Neste século tão racionalista o Mundo andou suspenso pelo vaticínio de um polvo. Muito se falou dessa escolha. Os media desenvolveram o assunto e aventaram-se hipóteses acerca da origem de tais dons divinatórios.

O prognóstico favorecia a Espanha, uma interpretação que, a priori, acalmava os jogadores, predispondo-os a uma vitória suada, mas que seria uma vitória. A sugestão funciona quase sempre e, claro, havia que alimentar os pensamentos positivos...

Por tudo isto e, sendo o polvo um ser vivo tão especial, logo apareceu alguém que o retirou dos cardápios. Pelo sim, pelo não, os simpatizantes da equipa de nuestros hermanos não podiam nem queriam abusar deste instrumento de bom augúrio!...

À maneira do oráculo de Delfos na Grécia antiga, o polvo sugeriu e os analistas interpretaram o veredico....dando a vitória à bandeira mais vistosa. E assim, aconteceu o triunfo da Espanha no Campeonato do Mundo!!!


Washington, 8 jul (EFE).- O chef espanhol José Andrés retirou o polvo dos cardápios de seus restaurantes nos Estados Unidos em homenagem a 'Paul', o 'oráculo' do futebol que vaticinou e acertou a vitória da Espanha contra a seleção alemã nas semifinais da Copa do Mundo.
Andrés anunciou a retirada dos pratos de polvo pela rede social Twitter. Hoje, fontes de sua empresa confirmaram à Agência Efe que cumpriu com sua palavra e não haverá cliente que possa experimentar as iguarias de polvo que constam em seu cardápio até o fim da Copa, no próximo domingo.
A admiração e a superstição convenceram o chef, estabelecido em Washington. Como muitos outros torcedores espanhóis, ele cedeu às previsões do profeta marinho, que comeu a ostra da equipe vencedora em seis ocasiões.
'Paul' só falhou na final da Eurocopa de 2008, ao prever a vitória da Alemanha contra a Espanha, quando o título daquele torneio acabou nas mãos dos espanhóis.A final da Copa será disputada entre Holanda e Espanha no próximo domingo, às 15h30 (horário de Brasília), no estádio Soccer City, em Johanesburgo."

Nota - Como o observador atento verifica, a notícia publicada na Internet dirigia-se especialmente ao público brasileiro...

segunda-feira, 5 de julho de 2010

O envelhecimento e os outros...

O envelhecimento é progressivo. Lentamente o corpo dá os primeiros sinais. Doi hoje aqui e ali, amanhã. Lentidão assume-se como uma palavra adequada aos velhos. Rápido é o cansaço das tarefas diárias, mas demorado é o restabelecimento. A vida faz-se de movimentos lentos, tal como decorre lento o raciocínio e a capacidade de decidir. O velho hesita, pondera e, muitas vezes. desiste. Perde a vontade de desfrutar aqueles prazeres de outrora...pára no tempo.

Como se sabe, o envelhecimento envolve um estado de tripla dimensão: físico, mental e emocional. Perda de capacidades e medos determina um sentimento inconfessável de solidão. E porque o mundo está virado para os jovens e para a beleza, os velhos aparecem como um estorvo. É assim para a família, para os amigos e, em geral, para a sociedade. Eles gostam de falar do passado e o mundo de hoje tem pressa, não dispõe de tempo para ouvir. Todos somos culpados disso, porque nos ensinaram os perigos de contágio da tristeza e a velhice é quase sempre triste.

Assim, vivemos fechados no nosso egoísmo, poupados a qualquer sacrifício. Passamos a vida, cruzamo-nos, mas sem parar. Os velhos, queixando-se da solidão, obrigam-se a ver e ouvir os outros que clamam. Contra o mundo, dizem eles, que não assegura os seus direitos. E continuam numa afronta aos velhos: estará garantido, no futuro, o pagamento das suas reformas?

Ocorreu-me este desabafo, cruzando-me esta manhã com uma vizinha que conheço há mais de quarenta anos. Então, era nova, despachada e vestia-se impecavelmente. Agora, gorda e trémula, de negro vestida, atravessava a rua muito agarrada à sua empregada. Apeteceu-me cumprimentá-la, dizer-lhe "olá". Ela já não me conhece e eu, cobardemente, desisti e continuei...

sábado, 3 de julho de 2010

João Moutinho, adeus ao Sporting

Aqui está uma cena irrepetível, porque João Moutinho acaba de assinar contrato com o Futebol Club do Porto. Desconheço os contornos do negócio, mas lastimo a partida de um jogador que me parecia de "pedra e cal" no club onde cresceu como futebolista e como homem.

E quando se julgava que Moutinho era inegociável...
Mas "é a vida..." "tudo na vida tem um preço, menos a honra". Duas afirmações de figuras públicas que não necessitam de mais explicações. Que assim seja! Capitalizem-se os euros e salve-se a honra!

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Palavras antigas

Eduardo Agualusa, um expoente da nova geração de escritores angolanos

O grande país, que é Angola, moderniza-se. Porém, os caminhos do desenvolvimento económico e cultural desenrolam-se em atitudes e comportamentos contraditórios. Realidades dos novos quadros sociais que não escapam ao olhar atento de jornalistas e escritores. Pepetela e Eduardo Agualusa assumem, cada um à sua maneira, a crítica dessa sociedade. Lembro do primeiro o romance Predadores e de Agualusa, O Vendedor de Passados.

Este remete para a nova burguesia endinheirada de Angola. Sátira onde o bom humor casa com o tom crítico e, simultaneamente, poético desta construção de identidades falsas... Leve e divertido, este "Vendedor de Passados" não é uma obra superficial. Comenta e reflecte temas diversos, alguns bem comuns. Escolhi um deles que intitulei "palavras antigas".

"Gaspar, assim se chamava o professor, comovia-se com o desamparo de certos vocábulos. Dava com eles abandonados à sua sorte, nalgum lugar ermo da língua, e procurava resgatá-los. Usava-os com ostentação e persistência, o que consternava uns e desconcertava outros. Creio que triunfou. Os seus alunos começaram por utilizar esses vocábulos, primeiro por troça, a seguir como uma gíria íntima, uma tatuagem tribal, que os fazia distintos da restante juventude. Hoje, assegurou-me Félix, são ainda capazes de se reconhecerem uns aos outros, mesmo quando nunca se viram antes, às primeiras palavras.
" Ainda tremo de cada vez que ouço alguém dizer edredon, um galicismo hediondo, em vez de frouxel, que a mim me parece, e estou certo que você concordará, palavra muito bela e muito nobre. Mas já me conformei com sutiã. Estrofião tem outra diginidade histórica. Soa, todavia, um pouco estranho - não concorda?"