"Foi na Idade Média que a lide taurina começou a definir as suas regras. Depois de constar de uma diversão ou jogo bárbaro, praticado por toda a ralé e que os senhores tomavam como espectáculo, na tradição cartaginesa e romana, a lide tornou-se um treino de guerra, assim como a caça era.
A expansão que ela permitia, a compensação das inibições que ela constituía, tornaram a caça, como a guerra e a lide taurina, um prazer irrefreável. O alanceamento dos toiros foi praticado como uma prova que contraria no homem a "ânsia de segurança". A necessidade que o homem tem de confiar-se aos outros, como se isso afirmasse a sua protecção contra os perigos, torna-se em dado momento como que a revelação de outro perigo maior: a desinibição total, que compromete o desejo e a atitude como vínculos de crescimento. É assim que aparece, a par da ânsia de segurança, o desprendimento, o desafio face à ternura humana, e o impulso de morte.
A touria que D. Pedro tinha na Serra d´El-Rei devia ser um cercado onde as reses bravas eram conservadas em relativa liberdade, uma espécie de primitiva ganadaria. A extrema sensibilidade do touro bravo para escolher os pastos , o seu sentido olfactivo apurado, levam a pensar que a touria seria uma área demarcada e não um curral. A lide estaria integrada na arte da caçada, e não funcionava portanto como espectáculo. E, sobretudo, não incluía a participação de rústicos, excepto quando se tratava de socorrer os senhores derrrubados ou feridos."
Agustina Bessa Luís, Adivinhas de Pedro e Inês, Guimarães Editores, Lisboa, 1986, pp. 128-129.
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